No Estado Democrático de Direito, no qual as normas são positivadas e norteadas pelo postulado da legalidade, estar em conformidade com a legislação pertinente àquela atividade econômica é pressuposto lógico e obrigação legal. Desta forma, o conceito que estabelece compliance como seguir as leis, normas e procedimentos internos além de firmar parcerias éticas, é definitivamente simplista para a amplitude de benefícios que podem ser obtidos.
Até bem pouco tempo atrás no Brasil, o compliance estava restrito às multinacionais e a setores extremamente regulados, como o financeiro e o de saúde, contudo, houve uma mudança bastante relevante na abordagem do tema quando aquelas perceberam as ações de investigação e penalização crescente de forma muito acentuada no ambiente internacional e nacional, principalmente em função da Lei Anticorrupção (12.846-13) e diante das recorrentes operações policiais e judiciais que comprometeram as imagens das empresas.
Sendo assim, o incentivo e a motivação à uma política de compliance no ambiente corporativo é essencialmente econômica, uma vez que pretende mitigar o risco de sanções ou danos à imagem, o que acaba por se tornar tão somente uma prática burocrática que deve ser obedecida sem senso crítico.
Neste contexto, todas as vezes que se fala de compliance dentro de qualquer estrutura corporativa se pensa imediatamente no conjunto de medidas internas e burocráticas para evitar responsabilização atribuída pela Lei Anticorrupção, cujas sanções poderão ser diretamente aplicadas à sociedade empresária que teve benefício ou interesse na prática de determinada irregularidade contra a administração pública, e não somente ao funcionário ou pessoa que praticou o ato que será penalizado.
Dentre estas sanções estão cominadas: i. multas no montante de até 20% do faturamento, ii. Multas de até 60 milhões de reais, iii. publicação extraordinária da decisão condenatória em meios de comunicação; iv. suspensão ou interdição parcial de suas atividades; v. inscrição da empresa nos cadastros de empresas inidôneas ou similares.
Entretanto, por meio de uma visão mais abrangente podemos observar que além de postura e comportamento ético, pessoal ou corporativamente traz diversos benefícios ao ambiente empresarial.
O Programa de Compliance estabelece assim, procedimentos para prevenir, detectar e remediar riscos relacionados ao cumprimento de leis e regulamentos sob a perspectiva da ética e da integridade, tornando-se uma realidade no mercado brasileiro, de forma a adequar a atividade aos requisitos regulatórios de cada negócio e mitigar os riscos aos quais a empresa está exposta.
Todas as organizações, empresariais ou civis, de qualquer porte e ramo de atuação enfrentam influências internas e externas, o que torna incerto se elas atingirão seus objetivos — e essa incerteza é chamada de risco. A inobservância da legislação e/ou regulamentação aplicável é um risco na medida em que as responsabilizações e/ou penalizações podem prejudicar sobremaneira as sociedades empresárias, podendo acarretar desde um dano reputacional, até mesmo, sanções graves.
É em razão disso que, frente aos riscos existentes, a adoção de mecanismos capazes de mitigá-los é fundamental para o exercício da atividade empresarial e segurança dos sócios e administradores.
Com o apoio da administração do escritório, a identificação desses riscos precederá a implantação do programa de integridade e se dará pelo contexto da atividade, análise de documentos, aspectos regulatórios e entrevistas com todos os envolvidos a fim de colaborar com informações que servirão de base para a identificação das necessidades de compliance da empresa.
A partir da identificação dos eventos de riscos, com suas respectivas causas e consequências, níveis de probabilidade e impacto, é importante definir qual resposta será dada a cada risco, isto é, aceitá-lo, mitigá-lo, transferi-lo ou rejeitá-lo. Para cada risco, então, será elaborado plano de ação para atendimento da resposta ao risco, ou seja, definir-se-á quais os mecanismos serão utilizados para tratar cada evento de risco e permitirá a elaboração e revisão das normativas internas, tais como código de ética e conduta, políticas e procedimentos padrão, entre outros.
Cada implantação do programa é diversa e é tecnicamente muito difícil criar uma espécie de “receita”, uma vez que aspectos como área de atuação, quantidade de funcionários e frequência de contato com o poder público, por exemplo, devem ser levados em consideração quando da estruturação do programa de integridade, visando a torná-lo adequado e suficiente à mitigação dos riscos aos quais a empresa especificamente está exposta.
Ademais, como a gestão de riscos e a implantação de um programa de integridade não são uma atividade estanque, é preciso que continuamente as matrizes de riscos sejam atualizadas, visando aprimorar seus controles internos e mitigar as incertezas, e também monitorem seus programas para garantir a efetividades e a melhoria contínua do sistema de compliance.
As vantagens do programa de compliance consubstanciam-se em:
- Criar uma cultura que encoraje uma conduta ética e aderência ao Compliance;
- Identificar os riscos do mercado e os riscos específicos relacionados ao negócio da empresa;
- Prevenir e detectar condutas ilícitas existentes ou potenciais;
- Ajudar os colaboradores a cumprir a legislação, o código de conduta e ética, e políticas internas através de regras claras, divulgadas e acessíveis, de ferramentas fáceis de manejar, tais como intranet e sistemas de aprovação, e de controles legais e contábeis fortalecidos;
- Proteger a empresa em caso de falhas no Programa de Compliance, o que poderá servir como evidência para a redução de multas. Neste ponto, ressaltamos a importância de se implementar um programa robusto, bem estruturado e não um programa de fachada (sham programs), como destaca o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica do Ministério da Justiça;
- Maior conhecimento sobre seu próprio negócio e o mercado em que atua;
- Melhor aplicação de recursos;
- Maior proteção contra fraudes e demais irregularidades em sua cadeia de valor;
- Atração de profissionais de alto desempenho para a equipe;
- Diferencial competitivo e valorização da marca;
- Celebração de contratos de médio e longo prazo com outras empresas íntegras;
- Estabelecimento de parcerias e atração de investimentos de empresas estrangeiras e mesmo de investidores nacionais que queiram investir em empresas íntegras.
Desta forma, a implantação de um programa de integridade efetivo jamais prejudicará o desenvolvimento e a condução dos negócios, ao contrário; a empresa ganha em competitividade, pois fundada em princípios e valores éticos de conduta; eficiência econômica, porque otimiza processos e afasta o risco de seu negócio; e em segurança jurídica, pois assegura que a empresa e seus colaboradores ajam pautados em critérios de integridade e conformidade definidos na metodologia implantada.